Autor: Leonardo
Boff
No Brasil e alhures são milhões que
veem novelas. Atualmente uma, "Salve Jorge”, se desenrola na Capadócia,
Turquia, onde teria vivido São Jorge.
Entre os estudiosos há uma antiga discussão sobre o lugar de seu nascimento.
Ela vem largamente discutida por Malga di Paulo, pesquisadora da vida do
santo e que forneceu os dados para a atual novela. Um livro seu deverá sair
brevemente. Para Malga que conhece a fundo a Capadócia, todos os indícios
levam àquele lugar como a pátria natal deste famoso mártir. Outros o colocam
em Lod na Palestina, hoje Israel, onde se construiu um santuário em sua
homenagem.
É muito pouco o que podemos dizer
de forma segura sobre o tema. A escola de historiadores críticos da vida dos
santos e dos mártires, surgida a partir do século XVII, os Bolandistas, e sua
obra a Acta Sanctorum deixa a questão em aberto. Outro grupo, criado ao redor
de A. Buttler, baseando-se nos Bolandistas e acessível em português em 12
volumes, A Vida dos Santos (Vozes 1984) assevera: "Há toda uma série de
motivos para se acreditar que São Jorge foi um mártir verdadeiro e real que
sofreu a morte em Lida na Palestina provavelmente na época anterior a
Constantino (306-337). Fora disso, parece que nada mais se pode afirmar com
segurança” (vol. IV, p. 188).
Minha tendência é afirmar a Palestina e não Capadócia como o lugar de seu nascimento. A razão se prende
ao fato de que teria havido uma confusão de nomes. Com efeito, havia na
Capadócia um bispo chamado Jorge da Capadócia, fato historicamente bem
atestado. Entrou na história da teologia, em razão das polêmicas acerca da
natureza de Cristo: seria só semelhante a de Deus (arianos) ou seria a mesma
(antiarianos)? Tal discussão dividiu a Igreja. O imperador Constâncio II (um
de seus títulos era de Papa) queria assegurar a unidade do império mediante
uma confissão única, no caso, a ariana. Militarmente ocupou Alexandria, foco
da resistência antiariana e impôs Jorge da Capadócia como bispo ariano
(357-361), mais tarde assassinado. Isso consta até nos manuais de teologia.
Minha hipótese é que os primeiros
compiladores da vida de São Jorge, já no século V e depois, no século XII;
com o autor da Legenda Áurea, confundiram São Jorge com esse conhecido Jorge
da Capadócia e assim o fizeram nascer ai. Uma hipótese.
Deixando a discussão de lado,
importa lembrar sua figura mais conhecida: um guerreiro, montado sobre um
cavalo branco, vestido de couraça, com uma cruz vermelha num fundo branco,
enfrentando terrível dragão com sua lança pontiaguda.
Por seu pai ter sido militar,
seguiu essa carreira. Foi tão brilhante que o imperador Diocleciano o
incorporou à sua guarda pessoal com a alta patente de Tribuno. Quando este
imperador obrigou todos os soldados cristãos a renunciarem a fé cristã e
adorarem os deuses romanos, sob pena de morte, Jorge se recusou e saiu em
defesa de seus irmãos de fé. Preso e torturado, miraculosamente passou, diz a
lenda, ileso do caldeirão de chumbo e de vários envenenamentos. Mas acabou
sendo decapitado.
No início, no Ocidente, era
venerado apenas como um simples mártir com sua palma típica. Com tempo e
especialmente devido às cruzadas foi feito guerreiro com seus instrumentos
próprios, especialmente associado ao enfrentamento com o dragão, símbolo do
mal e do demônio. A lenda mais conhecida no Ocidente é a seguinte:
Certa feita, Jorge, como militar,
passou pela Líbia no norte da África. Na pequena cidade de Silene o povo
vivia apavorado. Num brejo vizinho reinava terrível dragão. Se sopro era tão
mortífero que ninguém podia se aproximar para mata-lo. Cobrava cada dia dois
carneiros. Terminados estes, exigia vítimas humanas, escolhidas por sorteio.
Um dia a sorte caiu sobre a filha do rei. Vestida de noiva foi ao encontro da
morte. Eis senão quando, surge São Jorge com seu cavalo branco e com sua
longa lança. Fere o dragão e domina-o. Amarra-lhe a boca com o cinto da
princesa. Esta o conduz manso com um cordeiro até o centro da cidade. Todos,
agradecidos, se converteram à fé crista.
É patrono da Inglaterra, já a partir
de 1222, mas oficialmente só em 1347 com Eduardo III com festa solene (the
St. George’s Day), da Rússia, de Portugal, da Bulgária, da Grécia, da
província da Catunha e de muitas outras cidades.
Uma polêmica se instaurou quando o
Vaticano em 1969 fez uma revisão da lista dos santos e retirou dela o popular
São Jorge, por motivos não totalmente claros. Houve uma grita geral,
especialmente, por parte da Inglaterra, da Catalunha e também do time de
futebol, o Corinthians de quem é patrono. O Card. Dom Paulo Evaristo Arns,
corinthiano fervoroso, intercedeu junto ao Papa Paulo VI para que mantivesse
a veneração de São Jorge, ao menos como celebração optativa. Ao que o Papa
respondeu: "Não podemos prejudicar nem Inglaterra nem a Nação
corinthiana; prossigam com a devoção”. Em 2000 João Paulo II, com senso
pastoral, restabeleceu a festa. Ele está presente nas tradições afro: Ogum
para a Umbanda e Oxossi para o candomblé-nagô. No Rio, o dia 23 de abril, sua
festa, é feriado municipal, pois é o patrono de fato da cidade.
No próximo artigo tentaremos
decifrar o arquétipo de base que subjaz ao guerreiro São Jorge e ao dragão.
Enquanto isso, fazemos nossa a oração popular: ”Andarei vestido e armado com
as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem,
tendo mãos, não me peguem e tendo olhos não me enxerguem... E meus inimigos
fiquem humildes e submissos a Vós. Amém”.
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sexta-feira, 29 de março de 2013
sábado, 23 de março de 2013
Papa surpreenderá com reviravolta na
Igreja,
diz Leonardo Boff
O
ex-sacerdote brasileiro Leonardo Boff, um dos mais destacados representantes da
chamada Teologia da Libertação, acredita que o papa Francisco surpreenderá
muitos dando uma reviravolta radical à Igreja.
"Agora
é Papa e pode fazer o que quiser. Muitos se surpreenderão com o que Francisco
fará. Para isso, precisará de uma ruptura com as tradições, deixar para trás a
Cúria corrupta do Vaticano para abrir passagem para uma Igreja universal",
disse Boff em entrevista que será publicada na edição da próxima semana da
revista alemã Der Spiegel.
O teólogo se
disse muito satisfeito que o novo Papa, o cardeal argentino Jorge Mario
Bergoglio, tenha assumido o nome de Francisco para seu pontificado. "Este
nome é programático: Francisco de Assis representa uma Igreja dos pobres e dos
oprimidos, responsabilidade perante o meio ambiente e rejeição ao luxo e a
ostentação", acrescentou Boff, que pertence à Ordem dos Frades Menores,
mais conhecidos como Franciscanos.
O estudioso
disse também que, embora em muitos aspectos - como o referente aos
anticoncepcionais, o celibato e o homossexualismo - Francisco tenha seguido uma
linha conservadora como cardeal, isso se deveu apenas à pressão do Vaticano.
Para ele, há elementos que indicam que o novo Pontífice é muito mais liberal.
Agora é
Papa e pode fazer o que quiser. Muitos se surpreenderão com o que Francisco
fará
"Há
alguns meses, por exemplo, ele aprovou expressamente que um casal de
homossexuais adotasse uma criança. Tem contato com sacerdotes que foram
repudiados pela Igreja oficial por terem se casado. E, o mais importante, é que
não se deixou separar de sua convicção que temos que estar do lado dos
pobres", destacou.
Boff rejeita
também as acusações que surgiram contra Francisco segundo as quais não deu
suficiente apoio a dois jesuítas que foram presos durante a ditadura militar
argentina.
"Conheço
as acusações e acredito no que diz o Prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel,
que como opositor ao regime militar esteve preso e foi torturado. Houve bispos
que foram cúmplices da ditadura, mas Bergoglio não estava entre eles",
opinou.
"Até agora, não há indícios claros de um comportamento censurável.
Pelo contrário, ele escondeu e salvou muitos sacerdotes perseguidos. Conheci
Orlando Yorio, um dos jesuítas que dizem terem sido traídos por Bergoglio, e
nunca fez a mim tais acusações", completou.
terça-feira, 19 de março de 2013
'Carnaval acabou', disse Papa após
assumir o comando da Igreja
BBCBrasil.com
Os primeiros três dias de pontificado do papa
Francisco já deram ao mundo uma amostra do que vai ser ter um sacerdote jesuíta
pela primeira vez na história como líder dos 1,2 bilhão de católicos no mundo.
Minutos após o resultado da eleição no conclave ter sido declarado na Capela
Sistina, um funcionário do Vaticano chamado de Mestre de Cerimônias ofereceu ao
novo papa a tradicional capa vermelha decorada com pele que o seu antecessor,
Bento 16, usava com orgulho em cerimônias importantes.
"Não,
obrigado, monsenhor", teria afirmado o papa Francisco. "Você pode
vesti-la. O Carnaval acabou!", disse. Esse foi apenas um pequeno sinal de
muitos nestes dias de que, como comentou um dos mais ácidos colunistas
italianos, Massimo Franco, do jornal Corriere Della Sera, "a era do
papa-rei e da corte do Vaticano acabou".
Outro
momento da verdade ocorreu quando o papa Francisco quebrou os lacres do
Apartamento Papal no Palácio Apostólico para tomar posse de sua nova casa.
Funcionários
do Vaticano se ajoelharam e se curvaram quando o arcebispo George Gaenswein,
secretário do agora papa emérito Bento 16 e ainda chefe da casa pontifícia,
procurava o interruptor de luz enquanto o papa observava imóvel a cena, na
penumbra. "Há espaço para 300 pessoas aqui", ele teria dito. "Eu
não preciso de todo esse espaço."
Nomeações
O novo papa
ainda não deu nenhuma indicação de sua escolha para o segundo cargo na
hierarquia do Vaticano, o de secretário de Estado. Claramente os cardeais e
monsenhores italianos que gerenciavam o Vaticano durante o pontificado de Bento
16 gostariam de ser mantidos em seus cargos (todos os altos cargos do Vaticano
expiram quando há um posto vacante na Santa Sé). Mas muitos ficarão desapontados.
O papa
Francisco espera fazer suas nomeações em seu próprio ritmo e em seu próprio
tempo, e deve fazer mudanças significativas em questão de semanas, conforme a
lenta burocracia do Vaticano avance.
O que vem
fascinando os vaticanistas é que o novo papa não tem um secretário ou assessor
pessoal que o siga em todos os lados como George Gaenswein fazia com Bento 16.
Poucas horas
após sua eleição, o novo papa escapou do Vaticano em um carro comum para rezar
na basílica de Roma onde o fundador de sua ordem rezou séculos antes. E então
pediu ao motorista que parasse no hotel para clérigos no centro onde havia se
hospedado em Roma antes do conclave para pagar suas contas e tomar seus
pertences. No dia seguinte ele novamente deixou o Vaticano, incógnito, para
visitar um amigo doente no hospital.
O novo papa
é um homem de hábitos frugais, um amigo dos pobres, na longa tradição de outro
ícone da Igreja Católica, e cujo nome ele emprestou, são Francisco de Assis.
Quando era bispo, ele costumava viajar por Buenos Aires em transporte público e
cozinhar sua própria comida em um pequeno apartamento.
Ele já pediu
aos colegas bispos da Argentina que não gastem seu dinheiro para viajar a Roma
para sua cerimônia de posse, mas para doarem o dinheiro da viagem aos pobres.
Por isso, as pessoas devem se preparar para algumas novas surpresas.
'Papa negro'
Os jesuítas
não são somente a maior ordem religiosa na Igreja Católica, mas também a mais
revolucionária. Fundada por um soldado que se tornou místico, são Inácio de Loyola,
no século 16, ela tem uma tradição de rigor intelectual e espiritual que sugere
que o Vaticano está prestes a passar por uma reformulação com implicações
enormes para o futuro da Igreja Católica Apostólica Romana no século 21.
A Companhia
de Jesus, para dar o nome oficial da ordem, apesar de proclamar sua lealdade
incondicional ao papa em Roma, já esteve em vários períodos na história
envolvida em atritos com a Cúria romana e foi até mesmo reprimida em várias
partes do mundo, para reemergir posteriormente.
Antes do
conclave, houve especulações sobre a possibilidade de o conclave escolher um
cardeal africano como o primeiro papa negro da Igreja Católica.
Em vez
disso, os cardeais-eleitores escolheram esse jesuíta de 76 anos cuja ordem é
chefiada por um sacerdote chamado de superior geral, em homenagem à origem
militar de seu fundador. Ele também é conhecido popularmente como "o Papa
Negro" por conta da cor de seu hábito.
O atual
líder da Companhia de Jesus é um padre espanhol, Adolfo Nicolás, cujo escritório
fica em frente ao Vaticano. Ele imediatamente enviou uma mensagem de
congratulações ao seu companheiro jesuíta papa Francisco após a eleição.
Vale a pena
lembrar que foi um ex-"Papa Negro", o padre Hans Kolvenbach, o
primeiro a quebrar a tradição de manter o cargo de superior geral até a morte,
como era a tradição também com os papas. Ele renunciou ao cargo em 2008, ao
completar 80 anos, sugerindo um novo precedente que os "Papas
Brancos" também poderiam seguir.
quinta-feira, 14 de março de 2013
"Habemus Papam": Francisco
- Por Frei Betto
|
O
papa Francisco – nome adotado pelo cardeal argentino Jorge Mario
Bergoglio - ao ser eleito novo chefe da Igreja Católica terá pela frente
difíceis desafios. O maior deles, imprimir colegialidade ao governo da Igreja e
reformar a Cúria Romana.
Para mexer nesse ninho de cobras, terá de remover presidentes de congregações (que, no Vaticano, equivalem a ministérios) e nomear para dirigi-las prelados que, hoje, vivem fora de Roma e são, portanto, virtualmente imunes à influência da “famiglia curiale”, a que, de fato, exerce o poder na Igreja.
Para modificar a estrutura monárquica da Igreja, Francisco terá de repensar o estatuto das nunciaturas, valorizar as conferências episcopais e o sínodo dos bispos e, quem sabe, criar novas instituições, como um colégio de leigos capaz de representar a Igreja como Povo de Deus, e não como sociedade clericalizada pretensamente perfeita.
Não será surpresa se, em breve, o novo papa promover o seu primeiro consistório, elevando ao cardinalato bispos e arcebispos dos cinco continentes (e talvez até padres e leigos, os chamados “cardeais in pectore”, que não são de conhecimento público).
Tal iniciativa deverá incluir o atual arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta. Paira certa incongruência no fato de a arquidiocese carioca não ter, há anos, cardeal titular, como há em São Paulo. Sobretudo considerando que o Rio acolherá, em julho próximo, a Jornada Mundial da Juventude, à qual o novo pontífice estará presente.
Para mexer nesse ninho de cobras, terá de remover presidentes de congregações (que, no Vaticano, equivalem a ministérios) e nomear para dirigi-las prelados que, hoje, vivem fora de Roma e são, portanto, virtualmente imunes à influência da “famiglia curiale”, a que, de fato, exerce o poder na Igreja.
Para modificar a estrutura monárquica da Igreja, Francisco terá de repensar o estatuto das nunciaturas, valorizar as conferências episcopais e o sínodo dos bispos e, quem sabe, criar novas instituições, como um colégio de leigos capaz de representar a Igreja como Povo de Deus, e não como sociedade clericalizada pretensamente perfeita.
Não será surpresa se, em breve, o novo papa promover o seu primeiro consistório, elevando ao cardinalato bispos e arcebispos dos cinco continentes (e talvez até padres e leigos, os chamados “cardeais in pectore”, que não são de conhecimento público).
Tal iniciativa deverá incluir o atual arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta. Paira certa incongruência no fato de a arquidiocese carioca não ter, há anos, cardeal titular, como há em São Paulo. Sobretudo considerando que o Rio acolherá, em julho próximo, a Jornada Mundial da Juventude, à qual o novo pontífice estará presente.
A imagem da Igreja Católica está manchada, hoje, por escândalos sexuais e falcatruas financeiras. Não se espere do novo papa atitudes ousadas enquanto Bento XVI lhe fizer sombra na área do Vaticano. Mas seria uma irresponsabilidade o papa Francisco não abrir, no interior da Igreja, o debate sobre a moral sexual.
Nesse tema,
são muitas as questões a serem aprofundadas, a começar pela seleção dos
candidatos ao sacerdócio. Já há uma instrução de Roma aos bispos para que não
sejam aceitos jovens notoriamente afeminados – o que me parece uma
discriminação incompatível com os valores evangélicos. Equivale a impedir o
ingresso na carreira sacerdotal de candidatos heterossexuais dotados de uma
masculinidade digna de Don Juan.
O problema
não é questão de aparência, e sim de vocação. Se a Igreja pretende ampliar o
número de padres terá que, necessariamente, retomar o padrão dos seus primeiros
séculos e distinguir vocação ao sacerdócio de vocação ao celibato.
Aqueles que
se sentem em condições de se abster de vida sexual (já que apenas aos anjos é
dado prescindir da sexualidade) devem abraçar a via monástica, religiosa, ainda
que alguns se tornem sacerdotes para o serviço comunitário. Já ao clero
diocesano seria facultado escolher a vida matrimonial, como ocorre hoje nas
Igrejas ortodoxa e anglicana, e com os pastores de Igrejas protestantes.
O caminho mais curto e mais sábio seria o papa admitir a reinserção de padres casados no ministério sacerdotal. Eles são milhares. No mundo, calcula-se cerca de 100 mil; no Brasil, 5 mil. Muitos gostariam de voltar ao serviço pastoral com direito a administrar sacramentos e celebrar missa.
A medida mais inovadora seria permitir o acesso de mulheres ao sacerdócio. Não há precedente na história da Igreja, exceto em países socialistas onde, clandestinos, bispos despreparados ordenaram mulheres cujo sacerdócio, ao vir a lume, não foi reconhecido por Roma.
O caminho mais curto e mais sábio seria o papa admitir a reinserção de padres casados no ministério sacerdotal. Eles são milhares. No mundo, calcula-se cerca de 100 mil; no Brasil, 5 mil. Muitos gostariam de voltar ao serviço pastoral com direito a administrar sacramentos e celebrar missa.
A medida mais inovadora seria permitir o acesso de mulheres ao sacerdócio. Não há precedente na história da Igreja, exceto em países socialistas onde, clandestinos, bispos despreparados ordenaram mulheres cujo sacerdócio, ao vir a lume, não foi reconhecido por Roma.
Nos evangelhos há mulheres notoriamente
apóstolas, embora não figurem na lista canônica dos doze apóstolos. Em Lucas 8,
1, constam os nomes de mulheres pertencentes à comunidade apostólica de Jesus:
Maria Madalena, Joana, Susana “e várias outras”.
A samaritana (João 4) foi apóstola, no sentido rigoroso do termo – a primeira pessoa a anunciar Jesus como o Messias. E Maria Madalena, a primeira testemunha da ressurreição de Jesus.
Facultar às mulheres o acesso ao sacerdócio implica modificar um dos pontos mais anacrônicos da ortodoxia católica, que ainda hoje considera a mulher ontologicamente inferior ao homem. É a famosa pergunta em aula de teologia: pode o escravo se tornar padre? Sim, desde que liberto, pois como homem goza da plenitude humana. Já a mulher, ser inferior ao homem, está excluída desse direito, pois não goza da plenitude humana.
Outros
desafios se apresentam ao novo papa, como o diálogo inter-religioso. Nos últimos
pontificados Roma deu passos significativos para melhorar as relações do
catolicismo com o judaísmo, levando o papa a visitar o Muro das Lamentações, em
Jerusalém, e isentando os judeus da pecha de assassinos de Jesus.
No entanto, retrocedeu quanto à relação com os muçulmanos. Em sua visita à Universidade de Regensburg, na Alemanha, em 2006, Bento XVI cometeu a infelicidade de citar uma história do século XIV em que o imperador bizantino pede a um persa que lhe mostre "o que Maomé trouxe de novo, e você só encontrará coisas más e desumanas, como sua ordem de espalhar pela espada a fé que pregava". Embora a intenção do papa fosse condenar o uso da violência pela religião – no qual a Igreja da Inquisição foi mestra – a comunidade islâmica, com razão, se sentiu ofendida.
Ao visitar
os EUA, em 2008, Bento XVI esteve numa sinagoga de Nova York, sem, no entanto
dirigir-se a uma mesquita, o que teria demonstrado sua imparcialidade e
abertura à diversidade religiosa, além de combater o preconceito estadunidense
de que muçulmano rima com terrorista.
Há que aprofundar o diálogo com as religiões do Oriente, como o budismo e as tradições espirituais da Índia. E buscar melhor aproximação com os cultos animistas da África e os ritos indígenas da América Latina.
É chegada a hora de a Igreja Católica admitir a pertinência das razões que provocaram sua ruptura com as Igrejas Ortodoxas e a de Lutero com Roma. E, num gesto ecumênico, buscar a unidade na diversidade, de modo a testemunharem uma única Igreja de Cristo.
Convém reconhecer, como propõe o Concilio Vaticano II, que as sementes do Evangelho vigoram também em denominações religiosas não cristãs, ou seja, fora da Igreja Católica há sim salvação.
O papa Francisco terá que optar entre os três dons do Espírito Santo oferecidos aos discípulos de Jesus: sacerdote, doutor ou profeta. A ser um sacerdote como João Paulo II, teremos uma Igreja voltada a seus próprios interesses como instituição clerical, com leigos tratados como ovelhas subservientes e desconfiança frente aos desafios da pós-modernidade.
A ser um doutor como Bento XVI, o novo pontífice reforçará uma Igreja mais mestra do que mãe, na qual a preservação da doutrina tradicional importará mais do que encarnar a Igreja nos novos tempos em que vivemos, incapaz de ser, como São Paulo, “grego com os gregos e judeu com os judeus”.
Assumindo seu múnus profético, como João XXIII, o papa Francisco se empenhará numa profunda reforma da Igreja, para que nela transpareça a palavra e o testemunho de Jesus, no qual Deus se fez um de nós.
“Habemus papam!” Já sabemos quem: Francisco. É a primeira vez na história que um papa adota o nome daquele que sonhou que a Igreja desabava e cabia a ele reconstruí-la. O tempo dirá a que veio.
sexta-feira, 8 de março de 2013
Crescer para ser feliz
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Ninguém é feliz todos os dias. Há dias nos quais
levantamos, mas parece que tudo em nós gostaria de ter ficado na cama. Há dias
nos quais nossos corações parecem estar nublados, somente nuvem, chuva e frio.
Sentimo-nos desanimados, e achando-nos o pior de
todos os mortais. Dias de fastio da alma, uma certa náusea da vida, um enjoo da
existência. Tudo fica muito rotineiro, o novo tornar-se velho, o belo, comum, a
alegria se despedaça em pequenos fragmentos de tristeza, parece que a
felicidade escorreu pelo ralo da nossa vida.
Se este é um dos seus dias, você saberá exatamente
do que estou falando. É sempre assim, somos mais capazes de compreender a dor
ou a alegria quando passamos por elas.
Contudo, esteja como estiver o seu dia
hoje, é bom lembramos algumas verdades.
Existe dentro de nós uma imensa sede de felicidade
e bem-estar. Tudo quanto fazemos na vida, desde o mínimo detalhe, até a coisa
mais complicada, é em busca desta felicidade. Daí nossa dificuldade de
lidar com esses dias nos quais a felicidade parece ter desaparecido.
Infelizmente, o alvo consciente ou inconsciente da
nossa vida tem sido a felicidade. Mas este não é o alvo de Deus para sua vida.
Neste dia, quem sabe infeliz para você, Deus quer que você olhe para um outro
alvo da vida. O alvo de Deus para você é o crescimento. Isto não significa que
Deus não queira sua felicidade, apenas quer alertar para o fato de que a
felicidade é uma conseqüência do seu crescimento.
Crescer, desenvolver nossa maturidade, desenvolver
nosso potencial, este é o alvo primeiro de Deus para mim e para você. Sem
crescimento não haverá felicidade. Se não crescermos, viveremos como crianças
desfrutando das pequenas alegrias que os nossos brinquedos nos dá, mas jamais
experimentaremos a real felicidade que vem dele.
Todo crescimento passa pela dor. A dor é o sinal de
uma nova vida, é o prenúncio de uma nova experiência, é o grito de um novo ser
nascendo em nós. Sem dor não haverá crescimento, sem crescimento, novamente,
não haverá felicidade.
Neste dia quem sabe de dores, você pode não estar
se sentindo feliz, mas você pode estar crescendo. Saiba que apesar das dores de
hoje, o crescimento virá e com ele a felicidade que você tanta almeja.
EDUARDO ROSA PEDREIRA é pastor da Comunidade
Presbiteriana da Barra da Tijuca e professor da Fundação Getúlio Vargas.
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