sexta-feira, 25 de janeiro de 2013


Família: desencontros e resgates
Roberto P. Coelho*

Há muitas famílias que não têm noção da vida sem limites de seus filhos. Algumas acreditam que as drogas, cujo contato é inevitável (bastando apenas, em alguns casos, o cuidado para esse contato ser apenas adiado), fazem parte do amadurecimento dos jovens e que uns experimentam como se fosse um direito, está cada vez mais incorporado como parte natural da vida. O significado do que seja bem e mal está cada vez mais relativizado nos dias de hoje em nossa sociedade, e muitos pais perderam o poder de guiar e orientar seus filhos, especialmente na idade em que os mesmos não têm condições ou competência para fazê-lo com clareza e sem riscos na sua integridade.
Assistimos, então, a uma geração de pais que obedece a seus filhos e que, para não perderem o “amor” dos mesmos, não os contrariam, sem saber que com essa atitude não somente perdem o amor, mas o respeito, por manifestarem tanta debilidade no exercício da autoridade que precisariam exercer. Como os filhos podem aprender a confiar em pais que não sabem exercer o papel de pais, mas apenas se tornam amiguinhos e/ou boas praças de seus pupilos?
Sem conhecimento, sem compreensão, sem discernimento, sem firmeza, muitos pais, tão perdidos quanto seus filhos (e para poupá-los dos riscos da violência fora de casa), dão sinal verde para que usem e/ou compartilhem drogas como fossem parte do cardápio rotineiro da família. Abdicaram, com isso, da capacidade de ensinar a refletir, dar orientação, se construir limites protetores, tornando-se tão violentos com a permissividade e atolados no medo de enfrentar os próprios filhos.  Há pais que cederam tanto, confundindo liberdade com irresponsabilidade, medo com amor, que deixaram a droga ocupar o lugar que a eles cabia na vida de seus filhos. Quando não temos consciência de qual o nosso lugar na construção de valores na vida de nossos filhos, quando não conseguimos ser amorosamente atentos, amorosamente envolvidos, amorosamente interessados, quando não conseguimos construir pontes para o sentimento de pertença, no qual o jovem consegue identificar a importância de sua presença na família, em sua comunidade e no mundo, tornamo-nos facilitadores de um vazio na comunicação que vai ser preenchido pelo ruído do não dito, não dialogado, não ouvido.
Confusos, magoados, perplexos, perdidos, com o menosprezo, à distância, a desonestidade dos filhos, a quem respeitaram o direito de usar o que quisessem, muitos pais se perguntam o que dizer e o que fazer agora com o descaso e o egocentrismo dos filhos. Como não podemos mudar o passado e tampouco se torna útil e proveitoso mergulhar em autocondenação sobre aquilo que não se consegue enxergar lá atrás, quando se agia como facilitadores, é necessário olhar o presente com o desejo sincero de alterar a velha  concepção sobre a vida que vivemos. Uma mudança que começa na forma como encaramos a nós mesmos e que vai mudar a forma como nos relacionamos com os outros, especialmente os filhos. Leva tempo, dá trabalho, exige paciência, exige boa vontade, honestidade, mente aberta, fé e muito amor.
Quem não estiver disposto a dizer não na hora em que o não se faz necessário ainda não está preparado para ser pai e/ou mãe. É bom não lamentarmos os filhos que de alguma forma nos decepcionam com suas escolhas, descaminhos e destino. Podemos aprender com eles que pais se constroem, não nascem prontos, e que é sempre hora de aprender a corrigir o curso de nossa comunicação com o outro. É sempre hora de pedir e aceitar ajuda. Descobriremos, então, perplexos, mas não perdidos como antes, que há muito que fazer viver, compreender, muito pouco tempo para lamentar.

*Roberto P. Coelho, psicólogo, é ouvidor da Coordenadoria Especial da Promoção da Política Pública de Prevenção à Dependência Química da Prefeitura do Rio.